Deixa eu te falar da noite, de Paulo Roberto Farias

Romance “Deixa eu te falar da noite”, de Paulo Roberto Farias, lançado em 2021 pela editora Caos & Letras. Uma narrativa em primeira pessoa, cujo ritmo e tom impressos assemelham-se a uma conversa na varanda de um apartamento, sob o sol primaveril no entardecer de um final de semana — como toda boa conversa deve ser. E neste sentido, o título não poderia ser mais apropriado, como uma espécie de pedido ao interlocutor (leitor) para ouvir sua história.

A trama se desenvolve sem grandes sobressaltos ou atropelos para se chegar a algum ponto específico. Em sua escrita, ou voz narrativa da protagonista, o estilo é repleto de marcas da oralidade, sem exageros e usos inoportunos ou até irritantes, como a ênfase de caracterizar algo fatalmente induz muitos escritores ao erro. Mesmo a repetição de frases, enquanto marca mais contundente dessa oralidade, não traz prejuízo ao texto, justamente por fazer parte da construção da personagem.

Sem divisões capitulares por títulos e estruturado por longos parágrafos seccionados por espaço, a narradora-protagonista, Marla, intercala as mais variadas observações sobre o cotidiano com os eventos ocorridos em sua vida. Embora inúmeros espaços físicos componham os cenários em Deixa eu te falar da noite, é nas lembranças e pensamentos de Marla onde tudo acontece, sem as urgências da vida moderna. Ao intercambiar linhas digressivas e aproximativas, autor e narradora nos inserem no tempo psicológico, caracterizado pelas vivências subjetivas da personagem principal. O que coloca em jogo a questão existencial enquanto tema ou problema a ser desenvolvido.

A vida numa capital longe da família, as tentativas de passar no vestibular, a exploração de trabalho, os relacionamentos malfadados, os conflitos internos e externos impostos pela vida. Outra questão não menos relevante ou no mínimo curiosa é a relação olfactofílica (osfresiolagnia) de Marla com o outro, tal como observa Emmanuel Levinas: “O cheiro do outro se impõe em mim, como o rosto do outro, sem deixar espaço para resistência”.

Uma obra intimista, por assim dizer, com boas doses de humor e tensão, personagens e enredo cativantes.

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@pauloroberto.farias @caoseletras

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